É como é chamado o trem que faz a rota entre as cidades bolivianas de Puerto Quijarro, na fronteira com o Brasil, e Santa Cruz de la Sierra. Espécie de rito de iniciação de todo mochileiro que se preze, o comboio cobre parte do trajeto que vai do Brasil à cidade inca de Machu Picchu, no Peru. Porém, ao contrário do que parece, seu nome não vem do fato de ele fazer um percurso cheio de perigos, como desfiladeiros, pontes prestes a cair e bandoleiros mal-encarados. O apelido nasceu no século passado, quando a composição foi usada para transportar leprosos, doentes e corpos das vítimas de uma grave epidemia de febre amarela que se abateu sobre a região de Santa Cruz. Além disso, naquela época, a ferrovia não estava em suas melhores condições e descarrilamentos eram comuns, o que contribuiu para reforçar a má fama do trem. Bom, mas chega de falatório. Prepare a mochila, e bem-vindo a bordo!
Lenda sobre trilhos
Saiba o que encontrar e como se virar na famosa locomotiva dos mochileiros
Partindo do Brasil, antes de pegar o trem da morte, é preciso chegar a Corumbá (MS), na fronteira com a Bolívia. De lá, dá para ir a Puerto Quijarro a pé - uma cidade é coladinha à outra. Para entrar na Bolívia, basta apresentar o RG e o certificado de vacina contra febre amarela. O ponto de partida é a estação de Puerto Quijarro, que, de tão movimentada, parece até uma feira livre. A passagem para Santa Cruz é uma merreca - a mais em conta sai por 19 bolivianos (cerca de 6 reais) -, mas deve ser comprada com antecedência, para não correr o risco de pagar o triplo do preço na mão de cambistas. Três comboios diferentes fazem a rota da morte. O preferido pela galera, por ser mais barato, é o Regional - mas haja paciência: são mais de 19 horas de sacolejo! No Expresso Oriental, o trajeto é feito em cerca de 16 horas. Já o Ferrobus, o mais bacanudo, tem vagões com cama e gasta menos de 14 horas.
Para quem está com a grana contada, ou quer uma experiência roots de verdade, o lance é encarar o trem Regional. Mas se prepare. Os bancos são duros, com encosto fixo em 90 graus, e, como estão quase sempre lotados, muitas vezes a galera tem que viajar de pé ou dormir no chão, em meio a porcos e galinhas. A lentidão da viagem é garantida pelo pingapinga do comboio: ele vai catando e deixando gente em tudo quanto é vilarejo ao longo dos cerca de 640 quilômetros entre Puerto Quijarro e Santa Cruz. Mas o visu de extensas planícies compensa. Há trechos entre montanhas, mas que são fichinha perto dos precipícios da cordilheira dos Andes.
Hoje, os descarrilamentos de vagões são raros. O maior perigo na viagem é ter uma baita dor de barriga por intoxicação alimentar. Nas paradas rola de tudo: desde limonada em balde até espetinho de carne de porco par a lá de suspeito. Em vez de encarar essas iguarias, a galera mais escolada leva um lanche reforçado na mochila. Também é preciso ficar de olho na bagagem. Com o intenso vai-e-vem de vendedores e o desce-e-sobe de passageiros nos vagões, se o cara se descuidar pode ficar sem a bagagem. Por precaução, vale amarrar a ponta da mochila numa corda e prendê-la às barras do bagageiro.
Finalmente, após horas de sacolejo e espreme-espreme, chega-se a Santa Cruz de la Sierra, cidade mais populosa da Bolívia e destino final do trem da morte. De lá, para seguir por terra a Machu Picchu, é na base do busão. O roteiro clássico, cruzando os Andes, passa por várias cidades até chegar a Cuzco, no Peru.
Percurso de ferro
O trajeto até o trem da morte já foi todo feito sobre trilhos
A galera que pega o trem da morte, na Bolívia, em geral chega a Corumbá (MS), ponto mais próximo da fronteira, de ônibus ou de avião. Mas, até o final da década de 1990, a viagem já começava sobre trilhos. De Bauru, no interior paulista, eram 1 300 km até Corumbá - quase o dobro do percurso do famoso trem boliviano. Hoje, esse trecho no Brasil é restrito a trens de carga.
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